sábado, 30 de junho de 2012

mágico relevo da tez ...





Ontem,
num céu de roubado anil
através de alado mosaico
eu senti que a noite caiu
em forma de arabesco bordado

com curvas, tramas, traços
revelando imenso desejo
de minh'alma que agoniza
por mais um enlace com a tua

então, foi assim que eu te criei:
pedra em forma de encanto
falo germinado em recanto
desabrochado à beira mar

era espelho bipartido
de avesso colorido
como num cordel a figurar

mágico relevo da tez
amuleto que protege rei
universo teu
misturado ao meu nácar

lira que assobia em luxúria
o azul que ardia em fúria
em romaria à pele flambar

calor que arrefece e incendeia
fogueira d'água – lua cheia
o doce que tinha a poesia
na boca tua que ardia

estrela a noroeste
jagunço com magnólia na veste
em sua lapela a transpassar

teu grito contido, resvala
eu posso escutar tua fala

na caixa de um silêncio inconteste





pincei do lindo blog:

sobomarazuldeadria.blogspot.com

 

 

 


sábado, 23 de junho de 2012

no chafariz






Quando as lágrimas
tocam as pétalas feridas
há um breve piscar de olhos
 nos anjos do chafariz...



DAVI CARTES ALVES




sexta-feira, 22 de junho de 2012

Inverno






Lá fora o inverno
restam algumas flores baldias
resistindo heróicamente ao algoz de gelo
Jazem lânguidas, lívidas e esquecidas

O sopro da morte,
borrifado atravéz da brisa crestante
faz com que desfolhadas
balbuciem o último suspiro

Prematuros suicídas
Incauto namorado
A flor do ipê dourado
fulminado
com a azaléia rosiclér

Assim partiram também
o teu sorriso e o meu desejo
melados de quentão
naquela noite de inverno
na feira do pinhão

debaixo deste céu de chumbo
deslizas altaneira
neste calçadão de gelo
teu charme em relevo
emaranhado em cachecóis
me enlevam, me arrebatam
despretensiosamente,
sem apelo

linda ninfa
ficas ainda mais bela
de sobretudo caramelo
os anéis dos seus cabelos
 me anelam
ao roubarem beijos
 dos seus lábios de mel
como travessos colibris.
 


DAVI CARTES ALVES





quarta-feira, 20 de junho de 2012

Paçoca para cachalotes










Já idoso, mas muita saúde      
 muitos, muitos sonhos  

dormia na cadeia com uma laranja bem agarrada na mão

aos safanões, é acordado pelo carcereiro, para liberdade

Eita!!!  E é?

E caminhando daquele jeito peculiar  tchu tchu tchu , saiu, trôpego e resignado de poderes insossos, com o chapeuzinho balangãndinho que quase caiu quando passou o ruidoso caminhão de areia, 

amou como nunca a chuva fria, nhac nhac nhac, querendo devorar os pingos que açoitavam os vincos profundos do rosto, feliz!

Viu que os filhos da Mirda estavam grandes e soube que a Joaninha  foi com a Anita para casa da Maria.

Depois , foi na casa da Órdeci , um ser divino que carregava n’alma a ternura  quando o assunto era criança e violetas cariadas de desafeto, as mãos grandes como rústicos cachos de banana, o coração uma barril de lagrimas, flores, novelos e bolinho da chuva com café, 

pra quem chegava:  vô frita mais!!!

Mas lhe intrigava mesmo era a filha do meio, ela tinha sempre uma sacola ( retornável) de gargalhadas,  para dias e dias de garoa,

 adorava recitar Byron ao se depilar,  inebriada em feixes de luz 

os amores dissolviam naqueles lábios cadinhos, numa chuva de pequenas luas, 

deslizando as mãos pelas costas, ela reconheceu que as sementes de alumínio estavam  danificadas, pois lhe nasceram grandes  e belas asas cromadas, porem,  uma delas um pouco torta

depois de abaná-las três vezes, lembrou de três amores ao longo de dois  suspiros,

 e de como os domingos eram longos trechos de um deserto com pouca areia e muita dor 

no quintal, colhia nos braços o feixe de gérberas, com o mesmo cuidado,  afeto e carinho, com que se recebe um recém-nascido.

- O almoço esta pronto!

Quando a mãe deposita em seu prato um suculento pedaço de carne, ansiosa, diz que acabou o fio dental

-E os escritos?

- Só escrevo com a luz!

- É fotógrafa?

Seus olhos brilhavam diante daquela juventude livre e misteriosa,

Quando eram exatamente  16h42,  notou que ela foi ate a janela segurando com as duas mãos, um punhado,  

O que é isso???

Sorriu,  lhe acariciou com um longo olhar enternecido, e lançou o que era uma pequena porção de pequenos pássaros vermelhos,  pontilhando belamente o céu cinza amianto

Enlevou-se com os tons em vermelho  naquela pintura celeste,  céu de delícias, azul de quimeras, e a música dos pássaros vermelhos bordando mosaicos pro amor

Ele notou na mão, ainda a fragrância da laranja, não resistiu mais e perguntou:

Afinal , quem é você?

Ela preferiu repetir o refrão de sua música preferida:

“ Sou tudo 
o que você não pode controlar,
 em algum lugar 
além da dor.”




DAVI CARTES ALVES 







Kafka à beira-mar - Haruki Murakami












sapatilha com ponta de gesso






 Plumas que sopram alquimias
entardecer com  a  brisa em cores
sapatilha com ponta de gesso
beijando o  tablado
de um coração prisioneiro




DAVI CARTES ALVES






domingo, 10 de junho de 2012

há de saber as conchas...








Quem me quiser 
há de saber as conchas
a cantiga dos búzios 
e do mar

Quem me quiser 
há de saber as ondas
e a verde tentação 
de naufragar

Quem me quiser 
há de saber as fontes,
a laranjeira em flor, a cor do feno,
a saudade lilás que há nos poentes,
o cheiro de maçãs que 
há no inverno

Quem me quiser 
há de saber a chuva
que põe colares de pérolas
 nos ombros
há de saber os beijos e as uvas
há de saber as asas
 e os pombos

Quem me quiser 
há de saber os medos
que passam nos abismos

 infinitos

a nudez clamorosa
dos meus dedos
o salmo penitente 
dos meus gritos

Quem me quiser 
há de saber a espuma
em que sou turbilhão,

 subitamente

  ou então não saber 

coisa nenhuma
e embalar-me ao peito,
 simplesmente

   


Rosa Lobato de Faria – Escritora Portuguesa

                                                         imagem -    Les-oreades  -  William Bouguerau