sábado, 28 de janeiro de 2017

outro belo texto da Nara












Ser poeta vale menos que aprender a atar os cadarços pela primeira vez
As mãos pequenas demais para o laço
Uma concentração que se repetirá outras vezes nas provas mais difíceis da vida 
Vale menos que um banho de chuva
No começo um incômodo, e depois, a água escorrendo no rosto
Tanta alegria em meio à tarde dourada
Menos, muito menos, que a primeira crise de pânico
A falta de ar, a ausência total de referência de espaço
O medo gigante mordendo as sílabas das palavras
Vale tão pouco quanto atender o telefonema com a notícia da morte
O silêncio dentro da comida guardada em potes plásticos
Tão mínimo quanto descobrir que a lua flutuando no céu
É a mesma para quem quer que esteja sobre a terra
Ser poeta não nos livra da insônia e seus mil pensamentos ferozes
Não acompanha o homem sozinho quando volta pra casa embriagado
Nem dá a mínima pra o amor que surgiu quando os dois, por acaso, se encontraram
Naquela mesma situação, naquele específico dia
Ser poeta não vale nada
É de graça
Nem medo nem esperança agarram a mão que escreve versos






Assionara Souza








autora de,  entre outros  livros , Amanhã com sorvete


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