quarta-feira, 10 de outubro de 2012

Alguns toureiros







Eu vi Manolo Gonzáles
e Pepe Luís, de Sevilha:
precisão doce de flor,
graciosa, porém precisa

Vi também Julio Aparício,
de Madrid, como Parrita:
ciência fácil de flor,
espontânea, porém estrita

Vi Miguel Báez, Litri,
dos confins da Andaluzia,
que cultiva uma outra flor:
angustiosa de explosiva

E também Antonio Ordóñez,
que cultiva flor antiga:
perfume de renda velha,
de flor em livro dormida

Mas eu vi Manuel Rodríguez,
Manolete , o mais deserto,
o toureiro mais agudo,
mais mineral e desperto,

o de nervos de madeira,
de punhos secos de fibra
o da figura de lenha
lenha seca de caatinga,

o que melhor calculava
o fluido aceiro da vida,
o que com mais precisão
roçava a morte em sua fímbria,

o que à tragédia deu número,
à vertigem, geometria
decimais à emoção
e ao susto, peso e medida,

sim, eu vi Manuel Rodríguez,
Manolete , o mais asceta,
não só cultivar sua flor
mas demonstrar aos poetas:

como domar a explosão
com mão serena e contida,
sem deixar que se derrame
a flor que traz escondida,

e como, então, trabalhá-la
com mão certa, pouca e extrema:
sem perfumar sua flor,
sem poetizar seu poema




João Cabral de Melo Neto 














 

Um comentário:

Elisa T. Campos disse...

Oi Davi

Volto para apreciar as postagens anteriores.

Um abraço.